domingo, maio 31, 2009
quarta-feira, maio 27, 2009
O pior primeiro encontro do mundo
Quando ela me contou que sairia com o moço, cujo apelido era Zoeira, conversamos seriamente. E, entre racionalizações, piadas e justificativas, ela enfim me convenceu de que era uma boa idéia. No dia do encontro, esperei ansiosa por seu telefonema e notícias sobre o programa.
Ela escolheu o filme e eles combinaram ali, num cinema da Paulista. A sessão era às 17h00 de um domingo, o que significava sessão cheia. Assim, ficaram de se encontrar lá pelas 16h00, pra poder conversar um pouquinho antes de ver o filme e ainda garantir os ingressos. As 16h00 em ponto Ariana estava lá e nada do rapaz. Conforme o relógio tiquetaqueava, ela foi ficando aflita, a fila foi aumentando, e, por fim, ela decidiu comprar os ingressos de uma vez, pra garantir um lugar no filme.
Minha amiga já estava na fila há mais ou menos meia hora quando o camarada foi aparecer, lá pelas 10 pra cinco, com um super bafo de cachaça. “Cachaça não”, me confidenciou ela – “sabe quando fica só o cheiro do álcool etílico?” Ele se desculpou e botou a culpa em alguns amigos “da favela lá do bairro” (sic), que insitiram que a carne que ele fazia na churrasqueira era a melhor que eles já tinham comido na vida. Então ele ficara lá de chef cook e acabara tomando umas, e por isso havia se atrasado. “Perdão, linda”, ele dissera com cara de arrependido.
Embora Ariana tivesse ficado um pouco tensa com o ocorrido, resolveu não dar muita bola. Conversaram animadamente, ele contou sobre o churras “na laje” (sic) e enfim entraram no cinema.
- E foi aí que comecei a me irritar. Ele não calou a boca, do começo ao fim do filme. Falava alto e tava com aquele bafo. E ficava contando umas coisas sobre quando ele trabalhava de assistente social no Nordeste, e eu te garanto que isso não tinha nada a ver com o filme.
Ao saírem da sessão, ele sugeriu uma cervejinha ali na esquina da Joaquim Eugênio. Ela topou, estava um puta dum calor naquele dia. E, de repente, o encontro começou a ir por água abaixo.
- Eu estava falando sobre uma exposição lá na galeria e sobre o artista, que era esquizofrênico. De repente ele começa a criticar a saúde pública e a dizer que, QUANDO ELE TINHA DADO UMA PIRADA DE TANTO SE DROGAR, quase o levaram a força internado. Eu procurei saber o que tinha acontecido, mas quando vi, ele já estava falando de um outro assunto. Foi infernal. Cada vez que eu tentava falar alguma coisa, ele lembrava de alguma coisa muito louca, muito importante ou muito triste que tinha rolado com ele. Foi quando ele disse que quase tinha sido preso e aí eu comecei a ficar seriamente preocupada.
O enrosco não parara por aí. Minha amiga jurava que não sabia de onde tinha vindo aquele apelido, Zoeira, porque o cara não tinha nada de engraçado. “Ele devia ter o apelido de Umbigo, ou de Careta, porque além do papo ter sido super tenso, ele só sabia falar dele”.
Minha amiga nunca se sentira tão ignorada, deprimida e irritada na vida. A um dado momento, o cara começara a contar sobre sua formação em Ciências Sociais, e sobre seus conhecimentos em latim.
- O cara me interrompia o tempo todo. Ficava tentando me convencer com aquele papo intelectualóide, defendendo o PT, o MST e outros caras polêmicos. E quando eu arrisquei a dizer que política boa era utopia, temi pela minha garganta – ele me chamou de burguesa, citou Marx e começou a dizer de onde vinha a palavra utopia. Me passou a maior lição de moral, me explicou uma dúzia de palavras novas em latim, e eu me senti numa merda duma palestra de Direito Social.
Num dado momento, Ariana sentiu que ia explodir. Parou de responder. Só fazia “aham”. Quando o cara perguntou sua opinião sobre o modo de governo de Botswana ou algo do tipo, ela estourou e acabou por dizer, num fôlego só, que a África devia ser uma merda, que ela estava irritada demais, que ele era egocêntrico, ela nunca havia sido menos percebida na vida e que ele tinha uma puta dificuldade de dialogar.
“Na verdade, eu tenho DDAH” – confidenciou então ele, para iniciar outro monólogo triste e perturbador sobre sua dificuldade de aprendizagem e outros conflitos em época escolar devido ao Distúrbio de Déficit de Atenção e Hiperatividade.
- Não aguentei e disse que precisava ir para casa. Não era nem dez horas da noite e eu resolvi pedir a conta. Ele se ofereceu pra pagar, mas adivinha?
- Não...
- O cartão dele não passava. Acabei pagando a conta e ele ainda me pediu uma carona até um bar ali do lado, que ele ia emendar uma balada. Larguei ele ali perto da Rebouças e nunca me senti tão aliviada na vida.
- Ainda bem que durou pouco.
- Não acabou ainda. Umas duas horas depois ele me liga pra contar que foi atropelado por uma bicicleta enquanto atravessava a rua, torcera o pulso e estava em casa fazendo compressa de gelo.
- Fofinho, vai... querendo te contar as coisas...
- O cacete. Ele ainda não tinha terminado de falar dele mesmo. Essas merdas só acontecem comigo.
Desde então Ariana não marcou mais encontros, temendo dar de cara com mais alguma aberração. O tal rapaz voltou a chamá-la para sair, e após inventar mais um monte de desculpas, acabou falando na lata que não estava mais afim.
Alguns dias depois, conversando com ela, ela deixou escapar que o Zoeira tinha sido o último cara com quem ficara, e não pude deixar passar despercebido que a parte do beijo tinha sido ocultada. Poderia ter questionado, feito “ahá!” e investigado mais a fundo, arrancando detalhes possivelmente sórdidos. Por consideração e afeto, deixei passar batido e responsabilizei a carência, essa maldita, por ainda assim ela ter beijado o cara, talvez esperando que ele ainda virasse príncipe.
Ontem, ao encontrar Ariana, revelei que pensara em transformar o encontro em texto, e que não estava me lembrando muito bem de onde ela havia conhecido o Zoeira.
- Ele é amigo daquele meu ex-namorado, sabe aquele que me traiu com minha melhor amiga?
Ahá! Diz-me com quem andas, Ariana, e te direi quem és. Não haveria, por algum acaso, alguma palavra ou expressão em latim pra definir o acontecido?
Omni Omni Lupus... o homem é o lobo do homem!, diria provavelmente o Zueira...
delirado por N. Ferreira às 4:23 PM 3 delírios
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domingo, maio 24, 2009
postumum
Nada se encaixa com delicadeza no lugar vazio que você deixou. Restaram pedaços e fotografias nas quais você não se encontra; dias riscados em um calendário já esmaecido pelo tempo. No buraco desolador que um dia você ocupou, o vazio denso e impenetrável das minhas memórias habita fielmente, em homenagem póstuma ao nosso abandono.
Suas saudades deixam grandes lições. E grandes lições deixam, inexoravelmente, profundas cicatrizes. Esta que criamos oprime meu peito com tanta intensidade que é quase que como se você jamais tivesse existido - a dor da sua ausência é como a retirada de um velho móvel em um quarto antigo: tudo o que restam são marcas no tapete, manchas amarelas na parede, indícios de uma ocupação distante. Traços indiscretos de uma felicidade jamais concretizada, as evidências inegáveis do crime atroz que foi cometido aqui dentro. O lembrete perene do que não pode ser recuperado.
Se foi. Suas lembranças se espalham sob a forma cinzenta de memórias do que nunca existiu, sentimentos vagos que teimam em ruminar, a resistência implacável de se deixar esvaziar do que um dia foi como a única réstia de luz num aposento escuro, a iluminar as sombras existentes dentro de cada um de nós.
Neste momento, restaram as trevas – nada se pode ver a não ser a ausência desta luz. Persigo suas chamas e suas cinzas restantes aqui dentro de mim, enquanto me pego a sentir saudades das histórias que nunca vivemos, lúcidas como sempre, mais reais do que nunca, e que interrompem meu fôlego quando fecho meus olhos e procuro por você. Aqui dentro já não te acho. Não existe mais nada a perder, já que nunca houve nada que pude verdadeiramente ganhar.
delirado por N. Ferreira às 3:14 PM 4 delírios
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segunda-feira, maio 18, 2009
O Braço
É definitivamente digno de internação. E sim, aconteceu comigo.
Seria esse braço uma fuga da enorme carência que acomete os paulistanos que, em seu dia-a-dia atribulado, marcham rumo a seus empregos/famílias/meios de sobrevivência, sem entrar realmente em contato com o ambiente ao seu redor? Seria este braço apenas e tão somente um símbolo de um braço-direito que está ali para que você se apóie durante os percalços de seu dia-a-dia? Ou seria este braço apenas a única fonte de um cheiro minimamente mais suportável do que o do mendigo velho e bêbado atrás de você?
Justificativas. Apenas justificativas que encontro para explicar a bizarria de uma situação destas: o desejo de beijar o braço de um completo desconhecido num metrô meio ensebado. Não olhei seu rosto; não perguntei seu nome. Não sabia de onde vinha, em absoluto. Era apenas um braço sem corpo, sem história, que eu queria desesperadamente agarrar, apertar, morder, deixar junto de mim.
A que ponto se chega devido à falta de contato físico? Sequer sei dizer se o braço era de um homem ou de uma mulher. Porque, a bem da verdade, tanto faz se o contato físico, o toque, venha de um homem, de uma mulher, ou de uma criança. Tanto faz se existe ou não segundas intenções – não estou falando de sexo, seus pequenos pervertidos, e sim do toque entre seres humanos, do contato que nos faz sair de uma bolha, uma câmara hiperbárica isoladora, uma capa entre você e o resto do mundo.
Porque se a maioria das pessoas está acostumada ao toque físico em seu dia-a-dia, os meus andam absolutamente intocáveis, sem ironia nenhuma. Não toco meus pacientes. Não tenho tocado muito minha família, nem eles a mim, com exceção, talvez, do meu irmãozinho de 2 anos, o qual vejo ocasionalmente. E se o objetivo em meus treinos de kickboxing é acertar o adversário, é minha tarefa também não deixa-los encostar em mim. Transformei minha vida num ringue, ou num consultório de psicoterapia constante?
Todos os estudos mais recentes comprovam a importância do toque físico em um bebê recém nascido. Prive-o deste contato e lá virá bomba – teorias sobre o autismo infantil tocam (de novo?) nesse ponto delicado. E quanto aos adultos? E quanto a mim? Estarei eu desenvolvendo, em algum grau, um tipo de autismo tardio, devido a uma espécie de câmara hiperbárica subjetiva, como se eu fosse portadora de alguma doença gravemente contagiosa?
Minha terapeuta disse: é um desejo bonito querer beijar o braço de alguém no metrô. Aham. Eu sei que ela se refere ao desejo do contato e tudo e tal, mas já eu considero um ato desesperado de busca de afeto. Para que fique bem claro, é legal eu dizer que não beijei o braço do estranho. Humilhada pelos meus sentimentos e pensamentos, segurei meu impulso, ignorei o braço, voltei para casa e amarguei uma dor de cabeça pelo resto do dia, responsável por me deixar isolada num quarto escuro e silencioso (minha própria câmara hiperbárica?) até que minha cabeça voltasse ao seu estado normal.
Não sei se foi um impulso bonito, desesperado, carente ou incitado pelo fedor horrendo do mendigo atrás de mim. Mas, de qualquer forma, me recordei da terapia do abraço da minha mãe: é melhor eu começar a dar meus 6 abraços diários, se não quiser ser presa por assédio sexual pela Guarda Civil Metropolitana...
A verdade é que, quando você se sente sozinho, até mesmo o metrô parece acolhedor e aconchegante. E é por isso que, por via das dúvidas, essa quinta-feira eu vou no forró. O autêntico rala-coxa.
(sim, talvez eu devesse fazer terapia mais vezes por semana)
delirado por N. Ferreira às 2:06 PM 4 delírios
Marcadores: boas novas
quinta-feira, maio 14, 2009
Fight Fever! OSSU!
Apesar disso, deu pra fazer alguma coisa.
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Quando a luta acaba, e começo a ouvir os comentários, parabenizações, piadas sobre minha quase-joelhada, não sei se me sinto aliviada, orgulhosa ou humilhada. Minha baixa auto-estima suplica que eu enfie a cabeça na privada, mas meu espírito vence a disputa e fico ali com a galera vendo todo mundo mandar benzaço: Ligeirinho, Du, Renan, Tecchio, todo mundo abalou aquela academia.
No fim do dia, eu acabei chorando e me sentindo mal, mas hoje dá pra ver, consultando aqueles flashes, que foi só a ansiedade e a adrenalina. A exposição. Foi a insegurança. No geral, e sensei concorda, fiz um ótimo trabalho. A raiva do cara ter decido o cacete em mim é mágoa projetada: eu fui agressiva, ele respondeu à altura. Chega de ser protegidinha.
O fofo do Eder Jofre assinou minha luva, me chamou de simpática e cantou o melô: Nana, neném, que o bicho vai pegar! (ele não me conhece...)
....................
Passado quase um mês desse evento, ainda olho as fotos com alguma emoção. Eu tava apavorada, mas não fugi da raia, e pra quem é portadora de um transtorno de ansiedade, isso é uma puta conquista. Em julho tem um campeonato e até lá vai ser mais expectativa.
Equipe Seiwakai: thank you all guys!!
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É isso aí, sensei, passando pra frente.
É isso aí!
delirado por N. Ferreira às 8:26 AM 2 delírios
Marcadores: boas novas, kickboxing
domingo, maio 10, 2009
A Bela e a Fera
É redundante dizer que um espetáculo é maravilhoso. Um como “A Bela e a Fera” merecia um outro tipo de definição. É aquele tipo de coisa que transcende qualquer expectativa, que leva às lágrimas pela beleza, que impressiona pela magnitude, que hipnotiza pela pureza. Desde os aspectos técnicos – estruturas de palco suntuosas, iluminação fantástica, figurinos totalmente dignos da Broadway – até as canções e interpretações tocantes de cada uma das personagens, o musical atinge emocionalmente qualquer ser humano minimamente sensível, de crianças a velhinhos.
Mas não. Chorar nos primeiros 30 segundos de apresentação não é normal, nem mesmo num espetáculo da Broadway. E mesmo agora, passados quase 40 minutos do fim do espetáculo, ainda tenho vontade de chorar. E eu sei exatamente porque.
Sentir-se fera num mundo de Gastons pode ser o pior sentimento do mundo. Não há nada mais triste e desolador do que se ver sozinho entre a multidão. E a sensação de ser finalmente compreendido, apesar de ter endurecido ao longo dos anos de solidão, pode ser a corda jogada ao afogado. É encontrar a redenção e resgatar a esperança há muito, muito tempo perdida.
Nem só de livros vive uma mulher. Nem só de poder e dinheiro pode viver uma fera. Nem só de caças e prêmios sobrevive um Gaston. Todos buscam aquilo que todos nós sempre buscamos: o amor cor-de-rosa dos contos de fadas. A ausência de amor pode tornar as pessoas esquisitas. Pode transformar um príncipe em fera, condenado a querer acreditar novamente na beleza do ser humano e a amar ao próximo. A metáfora da rosa vermelha dada pela feiticeira, neste caso, é a representação mais bela do amor romântico – vira-se fera de uma maneira irreversível quando a crença no amor se esvai.
A história está recheada de amor dos mais diferentes tipos – não só entre Bela e fera, mas entre pai e filha, mãe e filho (representado pela Sra. Potts e seu filho-xícara Chip), seres humanos e seres humanos. O amor que é amor por aceitar a fera que habita cada um de nós, os seres imperfeitos que somos e o que fazemos aqui, neste mundo que nos coisifica, transformando-nos quase em objetos. Nesse sentido, é interessante reparar que a história convoca algumas características humanas básicas – a vaidade que transformou a Sra. Cômoda; a meticulosidade que transforma Dindon em um relógio; o calor e afetuosidade de Lumière, o candelabro mais espirituoso dos contos de fadas.
Confesso que chorei do começo ao fim da apresentação. Tive que esperar bem uns minutinhos para levantar da poltrona, inchada como um tomate, e ir embora. Chorei por tudo – pela minha fera interior, pela Bela que também vive em mim. Pelo pai que já não vive comigo, pelos lobos que enfrento por aí. Chorei principalmente por mim e por todos os seres humanos coisificados por aí, preocupados demais com seus carros, lipoaspirações, contas de banco e academias de ginástica. Tão iludidos que só conseguem olhar para o mundo através de um espelho mágico chamado televisão, chamado livros, chamado musicais da Broadway.
É pra chorar. Pra ver, rever e chorar.
Sem se segurar.
PS: É bom que se diga: a história não é da Disney, e sim uma adaptação da história escrita em 1756 (sim, tem mais de 200 anos!) pela francesa Madame de Beaumont.
delirado por N. Ferreira às 4:05 PM 3 delírios
Marcadores: boas novas, crítica, reflexões
sexta-feira, maio 08, 2009
Razorblade (that´s what I call love)
Oh, the razorblade, that's what I call love,
I bet you'd pick it up and mess around with it
If I put it down
It gets extremely complicated.
Anything to forget everything.
You've got to take me out,
At least once a week
Whether I'm in your arms,
Or I'm at your feet.
I know exactly what you're thinking
You won't say it now
But in your heart it's loud
Oh no, my feelings are more important than yours.
Oh, drop dead, I don't care, I won't worry.
Let it go.
Oh, the razor blade,
Wish it would snap this rope
The world is in your hands
Or it's at your throat
At times it's not that complicated
Anything to forget everything.
He would never talk,
But he was not shy
She was a street-smart girl,
But she could not lie
They were perfect for each other
Say it now
'Cause in your heart it's loud
Oh no, my feelings are more important than yours
Oh, drop dead, I don't care, I won't worry
Hey!
Sweetheart, your feelings are more important of course
Of course
Everyone that wanted
Everything that we would take from them
I don't wanna know, I don't wanna know
Tell me, tell me, tell me, tell me
No, don't.
Okay
delirado por N. Ferreira às 12:35 PM 0 delírios
Marcadores: deles
terça-feira, maio 05, 2009
Lobotomia
E, mais uma vez, meu Dr. McDreammy dorme com sua Isabela-fucking-Rosselini, sem saber exatamente pra que lado seguir.
delirado por N. Ferreira às 3:43 PM 2 delírios
Marcadores: curtinhas
domingo, maio 03, 2009
O Rato, as Meninas e Além
A questão é que, muito provavelmente, ele só devia estar atrás de um pouco de comida ou de abrigo, e apenas e tão somente por ser um rato, pode ter acabado entre os dentes de uma rottweiller babona pra caramba. Como quando nós vamos a uma pizzaria ou coisa do tipo, pegamos uma intoxicação alimentar e passamos dias vomitando e se dando mal à beça. Talvez se houvessem pizzarias para os ratos, eles não acabariam na nossa cozinha, e seus fins não seria tão trágicos.
A verdade é que uma simples mudança de perspectiva nos oferece um panorama totalmente diferente da situação. No fundo, um rato é apenas um bichinho qualquer que tenta ganhar a vida à sua maneira, o que pode significar entrar na casa de humanos e roubar pedacinhos mequetrefes de pão. Afinal, qual é o nosso problemas com os ratinhos? Não adoramos Mickey Mouse? E o Jerry?
E então, imagine você, alguém chega dentro da porcaria de pizzaria que você está, com uma vassoura enorme na mão ou uma panela apontada pra sua cabeça e você tem que fugir correndo dali sem ao menos saber por que. Talvez simplesmente porque sua cara peluda desagradou alguém por ali, você é o menor da turma e se deu mal. Só por isso.
E você sai da pizzaria e é perseguido por meia dúzia de brutamontes sanguinários doidos para sentir seus ossos estalando na boca. Tipo uns Carecas do ABC ou mesmo a polícia. Só não gostaram da sua cara, você é pobre ou preto, talvez extremamente obeso, e você tá é lascado pra caramba. É. A nossa polícia são as Meninas do povo, perseguindo nas cozinhas da vida bichinhos loucos por um pouquinho de pão, já que nas pizzarias eles são enxotados como ratos.
Fico pensando se tudo gira em torno da diferença de espécie, de classes ou se simplesmente o medo atiça a coragem dos valentões. Paradoxalmente, não é a ameaça que nos faz sucumbir à violência? Como um marido bebum que mete porrada na cara da mulher pra ela entender de uma vez por todas a não bater a porta da geladeira como se fosse da casa dela ou sei lá o que.
Aquele ratinho me fez pensar. A roda da vida gira incessantemente, sem parar, sempre no mesmo sentido. Ratos sempre serão ratos, perseguidos por gatos, caçados por cães criados e alimentados pelos homens. E acima de nós, quem é que está? Não quero nem pensar. Só faltava estarmos mesmo no topo da cadeia alimentar ou da droga do ciclo da vida. Dá vontade de ser um rato só pra não ter tanto peso acima das nossas cabeças. O ser humano é um bicho estúpido como o diabo e simplesmente não merecia essa posição de destaque. Mas então quem merecia essa posição?
Os ácaros. Pequenos, invisíveis, se alimentam de coisas que não fazem falta, não atrapalham ninguém e, mesmo quando precisam, agem no cúmulo do subterfúgio: eu estou espirrando pra chuchu, e não há nenhuma perspectiva dessa rinite acabar.
Pobre ratinho.
delirado por N. Ferreira às 8:42 PM 2 delírios
Marcadores: reflexões