quarta-feira, abril 04, 2012

Crer ou não crer. Eis a questão.

Eu consigo perceber exatamente quando chego num ponto existencial específico – o qual costumo denominar “o troço”: começo a passar boa parte do meu tempo absorvida em livros românticos ou seriados em peso, e gasto muitos minutos antes de dormir imaginando uma vida totalmente diferente. A nostalgia é palpável, e sem mais necessidade de terapia para descobrir, posso com franqueza admitir que me perco nas fantasias e nas histórias bonitas.
Sim, eu sei que são histórias. Eu sei que são personagens. Eu sei que alguém escreveu aquela fala, eu sei que não foi espontâneo. Sei que cada vírgula foi cuidadosamente colocada ali para dar o tom perfeito e o sentido ideal ao contexto. E também sei, dolorosamente, que esse tempo gasto produzindo sentimentos nostálgicos poderia estar sendo gasto vivendo a vida real.
Mas ouvimos desde cedo, desde pequenos, que para que algo aconteça nós temos que acreditar. Que tudo nesta vida se trata de uma questão de fé: acreditar no que você não vê, seja lá o que isso for. Deus, energia cósmica, calorias. Amor.
De um lado, temos todos os elementos da vida moderna nos chamando para o que alguns chamam de “realismo extremo” – você deve acreditar apenas nas duas únicas certezas da vida: morte, e impostos. Do outro lado, existem as fantasias, as histórias, o cinema, a Bíblia, os sonhos (ah, os sonhos...!) e as histórias que ouvimos falar mas nunca vimos acontecer, como Kony 2012 ou a Mega Sena, por exemplo.
Quando algo acontece em nossas vidas, e esse algo abala todas as nossas estruturas, fica fácil perder-se neste limbo emocional em que tudo são incertezas. Acreditar em algo pode realmente tornar-se um ato único de fé, ou uma fuga da realidade. E os únicos que podem julgar se este tipo de crença é válido ou não somos nós mesmos. O único meio de testar se nossas crenças são feitas de esperança ou de ilusão é avaliar como estão as nossas vidas.
Quando ouvimos alguém dizer que não acredita em nada que não se possa ver, costumamos dirigir a este um olhar preocupado, como se estivéssemos vendo um grande desperdício ocorrer bem na nossa frente. Internamente, desaprovamos esse tipo de conduta cética de ser. Algumas pesquisas recentes da Psicologia Positiva (sim, existe uma área da psicologia que se dedica somente a estudar as pessoas felizes) indicam o otimismo e a religiosidade como indicativos da bem aventurança, enquanto a ausência destes apontam para depressão e ansiedade.
Se deixar de acreditar faz de alguém um ser amargo e potencialmente vazio de esperança... acreditar então é bom? Ou é justamente do ato de acreditar que advém todas as nossas frustrações? Não se diz, aliás, que a expectativa é a mãe da frustração?
Afinal, no que se pode e no que se deve acreditar?
A vida se encarrega de nos rechear com exemplos do dia-a-dia. Mas nunca se sabe, com segurança, o que eles querem realmente dizer. Uma amiga se casa e você então conclui que sim, o amor existe inerentemente. Um ano depois ela se separa, e você pensa... então o que?
Num dia chuvoso de fim de mês você encontra 50 reais na rua e agradece ao “universo”, esse bonzinho, que te ajudou a terminar de pagar suas contas. Alguns dias depois você recebe em casa uma multa de 100 reais. E o universo, de bonzinho, passa a temível ou mesmo inexistente.
Uma recém divorciada é paquerada na rua por um homem lindo e volta para casa acreditando que nada é por acaso, que a felicidade está batendo em sua porta. Depois de dois meses, descobre que o homem lindo era casado.
Afinal, existem “sinais” sobre no que você pode ou deve acreditar? Ou o que chamamos de sinais são eventos aleatórios aos quais adoramos atribuir significados?
Eu costumava acreditar em muitas coisas, de vida extraterrestre a almas gêmeas. Hoje, confesso estar questionando até mesmo a realidade do agora – será que tudo isto, esta vida, este computador, esta cadeira, esta dor e saudades que sinto são de fato... reais? Ou seria tudo produto de um delírio humano? Estaria eu conectada à Matrix? Seria eu uma invenção de alguém?
Seria tudo isso invenção minha? O amor, as amizades, a ambição, o divertimento, a motivação... seriam criações da minha mente? Será que, na verdade, sentimentos não existem, e o que existe então é uma sensação associada a um pensamento... e portanto, apenas percepção? Será que tudo o que sempre imaginei para minha vida são criações que sequer são minhas, mas que outras pessoas (leia-se família, igreja, sociedade) colocaram na minha cabeça?
Às vezes me sinto culpada de fazer este tipo de questionamento. Como se Deus ou a energia universal fosse um dia me punir colocando um buraco no meio da rua para eu tropeçar, simplesmente por eu estar colocando em xeque toda a minha própria existência...! Mas, uma vez que eu nem mesmo sei se acredito em Deus, no universo, ou na eficiência da punição, todo este medo e esta culpa perdem a razão de ser.
E o que resta, em meio a todos os contos de fada, as fantasias, as músicas de amor e os sonhos de futuro, é a distante mas nunca tão próxima pergunta, quase que colada na minha pele... quem sou eu, afinal de contas?

3 comentários:

Anônimo disse...

Muito bom o seu texto.
Aliás seus textos são ótimos, meio engraçadas suas colocações. Me fez refletir sobre momentos que eu estou vivenciando.

Continue escrevendo pois continuarei lendo!

=)

Edilson disse...

Sempre te leio, pouco comento!

Nana, guria da qual gosto tanto. Gosto de ti pela firmeza como rege a vida, pelo caráter, pelo tanto de coisa boa que há dentro de voce, (e que, visivelmente, voce não mostra 10% do que realmente há de bom em voce).

Crer ou não crer, eis a questão!

Crença é uma coisa palpável ou não.

"Não palpável" é aquela que ainda não conseguimos explicar, é essa força maior, fluídica, mas que inegavelmente existe, e que nem sempre sabemos o que fazer com ela.

Já a palpável é aquela material e se instrumentaliza em receber na medida que se doa, portanto, voce passa a crer naquilo que devolvem à voce(coisas boas ou ruins), e isto, poder simplificado como: realismo-extremo.

A medida dessa "balança" da crença material, é que existir a defasagem, e daí, passamos a incrédulos.

Anônimo disse...

Interessante seu texto recente do 'crer', vários pensamentos que levam a outros imagino.
Mas (existencialismo), isso pra um dizer normal, sinceramente, (questões de manipulação e criação de seu viver, hoje, iniciados muito antes ainda), tem um ou outro texto interessante sobre isso na saladestandby.blogspot.com, dá uma olhada! A parte de outros focos bem revigorantes pra diversas situações do cotidiano.

E, claro! Só comecei a ler seu blog, longos textos, tenho interesse e farei tempo pra ler eles; quero dizer parabéns pela originalidade e disposição das coisas, tipo no início, Dalí(interessante quadro).

Pra você, a conquista merecida do que você busca!

TintoSecco