quinta-feira, janeiro 24, 2008

Apêndices

- Eu simplesmente adoro desfilar com ela na frente de outras mulheres. A sensação é incrível.

Foi assim que meu amigo Téo*, 30 anos, bonitão, descreveu o estado atual de sua relação com a gatinha da vez. Ela tinha 6 anos a menos, era bonita e - ao contrário de todas as outras mulheres que o Téo havia ficado após ter saído de um relacionamento de 6 anos – era inteligente e gente fina.

- Mas acho que ela ficou meio puta quando eu disse isso.
- Você disse isso para ela?
- Disse, mas a intenção era outra. Queria dizer que não tava no climinha pegação, que preferia estar com ela em vez de estar com as menininhas.
- E é claro que ela não entendeu assim.
- Claro. Ficou nervosa, achou que eu estava fazendo dela um troféu. Foi uma cagada, eu admito. Ela quase chorou, você acredita? Acho que ela tem aqueles complexos e tal, de ser vista só como uma bundinha bonita.
- Talvez ela goste mesmo de você.
- Acho que foi vaidade.


Péra lá! De quem ele estava falando? A vaidade era dela por ter quase chorado, ou a vaidade era dele por desfilar por aí?

- E você se explicou.
- Expliquei, lógico.
- E ela não acreditou, lógico.
- Lógico. Disse que eu era quem nem os canalhas que ela tinha conhecido.
- Você foi mesmo um filho da puta.
- E não é disso que vocês gostam?


Ouch! Confesso: quase desliguei o telefone. Era tão, mas tão nítido que aquilo fazia parte da necessidade de auto-afirmação do Téo que não era preciso um pingo de Psicologia pra perceber. Super ok, eu sabia que o Téo ainda nutria um amor recolhido pela ex, e esta era a primeira tentativa mais séria de esquecê-la. Além de estar com o coração estraçalhado, o Téo era um homem inseguro. Ele precisava provar sua virilidade, esquecer da bota que tomara da ex. No fundo, no fundo, ele queria era causar um ciuminho na garota. Eu entendia tudo isso, mas assim que desliguei o telefone e abri a primeira cerveja, não consegui sossegar.

Mais tarde, me peguei pensando no Téo e na coitada que estava saindo com ele, e então me lembrei do cara fantástico que conheci no inverno passado: carro bacana, profissão respeitável, gentil e educado. E no máximo 10cm de instrumento, o que me confirmou a teoria de que o que importa não é o tamanho da varinha, mas a mágica que ela produz – o sexo era melhor do que muito pintão por aí. Aí me lembrei porque não tinha dado certo: o filho da puta tinha namorada.

Pensando em troféus, desfiles e em auto-afirmação, não pude evitar de me perguntar: precisam os caras emocional e/ou fisicamente desfavorecidos fazer um “esforço extra” para se destacarem e se sentirem seguros? Precisam eles ser abutres no trabalho, ogros no futebol, machistas na cama? Me veio, na hora, a imagem mental de um HD externo: algo fora de si, um apêndice, a confirmar sua capacidade de “armazenamento”. Um falo. Um grande pinto externo.

Mulheres bonitas a tira-colo? Pau-externo.
Músculos? Pau-externo.
Carro do ano? PAU-EXTERNO.

Mas e se esse “HD externo” transformar o cara, internamente, em um mau candidato? Não seria trocar seis por meia dúzia? No caso do Téo, aquilo o tinha transformado em uma perfeito babaca. Me imaginei na situação da mocinha: eu continuaria saindo com um cara que me dissesse aquilo? Só se estivesse muito apaixonada.

Então eu me lembrei de como também tinha adorado aparecer com outro cara na frente do bonitão da praia, e tive que admitir para mim mesma que eu também tinha lá meus HD´s... foi um choque perceber que eu também desfilava, com ou sem carnaval. Adorava estar com um cara e sentir que ele tinha um ciuminho, motivado ou não. Afinal, eu também sou uma grande insegura.

Seria o grande problema ficar dependente dessa função externa? Não seria desejável que todos nós deixássemos de precisar disso em algum ponto da relação, em que finalmente nos sentíssemos seguros, possuidores de tudo o que precisamos ter para fazer alguém feliz? Afinal, não seria esse tipo de padrão o que Freud chamara, lá no comecinho do século XX, de histeria??

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Mais tarde, naquela mesma noite, eu voltei a ligar para o Téo, meio que para me redimir da culpa por tê-lo chamado de filho da puta. E garanti para ele que, se encontrasse com a mocinha, faria o filme dele.

Porque em um momento ou em outro, todo mundo precisa de um HD extra. E desde que na hora H se passe as coisas para o papel, tudo estará a salvo. Na pior das hipóteses, é só não falar nada pra gatinha.

E nem pro bonitão da praia!
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*Nome fictício, pra não acabar de vez com o filme desse anjo...

quarta-feira, janeiro 16, 2008

2008, still alive!


Dizem por aí que o que se planta, se colhe.

Nada nesta vida poderia ser mais verdadeiro... 2008 começou trazendo para mim todo o resultado final de uma abertura emocional que eu julgava nem existir mais. Todo o produto de uma somatória longa, um processo, uma equação de escolhas, decisões, sacrifícios e separações. E o saldo final, graças a Deus, se revelou positivo.

Se dizem que a cada segundo somos a evolução do segundo anterior, sinto hoje que certas coisas estão em pleno processo de evolução. Talvez eu esteja simplesmente contagiada pela febre do Ano-Novo, Vida Nova, mas o fato é que certas coisas começaram a mudar.

Me sinto mais corajosa... embora em alguns momentos eu trema de pânico. As crises de ansiedade têm sido cada vez mais frequentes, cada vez mais intensas, mas tenho aprendido a aceitá-las como momentos que trazem o novo, trazem reflexões, descobertas sobre mim mesma. A cada taquicardia eu percebo um medo diferente, e com ele, algo novo que assumiu novos valores, significados, importâncias. Um mundo ainda desconhecido se abre a cada palpitação e a cada gota de suor que eu sinto escorrer pela minha espinha, quando pensamentos corrosivos se manifestam e eu percebo o que há de valioso atualmente na minha vida.

O puro medo da perda. A perda do mínimo que se espera, do mínimo que se tem, do mínimo que se realmente valoriza quando percebo que no fundo, nada jamais teremos a não ser nós mesmos. O extra. O lucro. O medo da perda.

Fico aqui divagando... se eu não tivesse sacrificado um grande amor... se não tivesse dado a cara a tapa... se eu não tivesse ido naquela bendita festa... se não tivesse aberto a mente e o coração pra maré de coisas que nos inunda o tempo todo mas que geralmente secamos internamente com a aridez de nossas desilusões, de nossas frustrações, de nossas mágoas... onde eu estaria? Em que penumbra estaria me escondendo? No mesmo e antigo medo de sofrer? Na comodidade do conhecido, do reconhecido, do que achamos estar falsamente, mas muito falsamente mesmo, garantido?

Não se trata de merecer ou não certas coisas... se trata de se abrir para o novo e receber quem te bem quer como se fosse uma experiência única e livre de idéias pré-concebidas. Fácil? Jamais. Um treino constante. Um mantra: assertividade, disponibilidade e tranquilidade. 7 dias por semana. Uma luta.

Houveram vezes, há muito tempo atrás, em que achava que vivia só para morrer. Não eram apenas pensamentos fúnebres de uma mente adolescente. Era o pedido de ajuda de alguém arrasada por uma violação de sua infância, alguém que se julgava para sempre condenada a sentir dó de si mesma, que queria às vezes juntar um monte de comprimidos e enfiar goela a baixo, e não fazia por medo.

Certos pensamentos e crenças não somem facilmente. Ainda sou assombrada por certos fantasmas, sem rosto, sem nome, só com cheiros e barulhos. Ainda sofro às vezes com isso, a morte às vezes não me parece assim tão ruim. Mas decidi, de agora em diante, a acrescentar cada vez mais farinha na mistura que me faz ser uma pessoa cada vez mais forte, cada vez melhor, cada vez mais útil e aberta a qualquer tipo de emoção, qualquer tipo.

A antiga criança, a sofrida e suicida, há muito tempo não aparece. Deixou somente um cheiro de insegurança no ar. De paranóia e de certa melancolia. Aprendo com esses resquícios todos os dias. E me sinto renovada e disposta a aceitar o que a vida pode me oferecer.

Pois, se no momento em que julgava que apenas uma cerveja gratuita me faria feliz, encontrei tanta coisa boa, e um coração aberto para me deitar, o que não encontrarei daqui em diante?

Como dizia Lennon, a vida é aquilo que acontece enquanto fazemos planos para o futuro. Meu futuro é agora, e meu lugar é aqui – ainda viva!