quarta-feira, outubro 15, 2008

Lucros e dividendos


Outro dia, conversando com minha amiga Naty*, 29 anos, publicitária, me peguei a pensar. É que ela, após terminar com seu namorado, me ligou indignada por ter recebido uma ligação de um desses grandes magazines, de onde diziam que a fatura da compra de uma TV digital estava atrasada. O motivo da indignação era que não havia sido ela a compradora da TV carésima e ultra moderna, mas o ex, que havia usado seu cartão pela milésima vez. Rugia minha amiga que, apesar da compra ter sido feita enquanto os dois ainda namoravam (ele usar o cartão dela era um hábito), ela jamais chegara a assistir um único filme no novo aparelho, pois a entrega da TV demorara tanto que o namoro expirara primeiro. O problema era que, mediante as férias ‘forçadas’ do ex, ela sabia muito bem quem iria arcar com a parcela de R$299,00.

Frente à ira de minha amiga, me peguei a pensar em perdas e ganhos, e cheguei a cogitar comprar aquele livro da Lya Luft. No mesmo dia, por volta das 13h00, enquanto ia pra escolinha lá em Moema, vi na capa de uma revista a seguinte frase “Nem todo mal faz mal”, o que me remeteu ao célebre ditado: há males que vêm para o bem.

Quando se trata de relacionamentos, é difícil definir um padrão mais ou menos estável de quando se está ganhando ou quando se está perdendo. Como tudo na vida, existem os lucros e também os dividendos. Parcelas das Lojas Americanas, multas de trânsito, livros que jamais serão devolvidos, roupas que viram passado, a ‘conta’ sempre existente entre casais, estão do lado da balança rotulada ‘prejuízos’, aos quais soma-se o coração partido, a mágoa, o ego ferido e possíveis contas dos consultórios de psiquiatria e psicologia.

Geralmente, quando uma relação acaba, os prejuízos se tornam tão nítidos que fica difícil perceber em que ganhamos nos enfiando naquela relação. Sentimos que perdemos tempo, que perdemos dinheiro, que perdemos amor próprio. Às vezes, perdemos até a sanidade mental, perdemos amigos, perdemos famílias inteiras.

A coluna dos ‘ganhos’ tende a ser bem menor quando uma relação acaba com mágoas ou ressentimentos, ou quando pelo menos uma das partes não está de acordo com o rompimento. Nestas situações, dificilmente reconhecemos que algo naquilo tudo possa ter valido a pena, esquecemos dos bons momentos, e todo aquele amor fica soterrado debaixo de uma montanha de péssimas lembranças.

No meu último relacionamento, perdi muito mais do que os 6kg que sumiram em cerca de 20 dias por conta de um transtorno ansioso dos bravos; também perdi muito mais do que os R$60,00 em lighter lashes que jamais foram devolvidos. Muito embora meu livro O corpo fala faça muita falta, hoje sinto que os prejuízos materiais foram tão pequenos perto dos danos emocionais que, na verdade, eu acabei saindo no lucro. Hoje penso que as perdas concretas poderiam ter sido até maiores, se me tivessem sido poupadas as perdas emocionais.

Hoje, exatamente hoje, 16 de outubro de 2008, 7 meses após o término de um período tenebroso no meu campo afetivo, ainda é difícil perceber o que ganhei nesta relação (e, indo além, em muitas das relações que continuo mantendo até hoje sem saber quais os benefícios). Emocionalmente, fica ainda aquele gostinho amargo na boca, aquela mágoa no peito que às vezes sussurra no meio da noite que foi tudo perda de tempo. Racionalmente, a coisa muda de figura: hoje sei que, não fosse esta relação fracassada, eu ainda estaria no exatíssimo mesmíssimo lugar que estava no começo do ano, e já há tanto tempo: me sentindo vítima da situação, culpando aos outros pela minha infelicidade, desmotivada no trabalho e sem um pingo de cor-de-rosa na vida.

Sim, foi preciso perder tudo o que eu tinha, toda a alegria, todo o amor-próprio, toda a energia, pra finalmente reconhecer que não estava feliz há anos. Não fosse conhecer o sabor mais amargo da vida, não reconheceria hoje que tudo tem um quê de doçura, que tudo tem um certo colorido se a gente souber olhar bem. Trocando em miúdos, foi preciso perder quem eu era, pra começar a ser quem eu sou.

Na balança dos meus lucros e dividendos, das minhas perdas e ganhos, foi difícil perceber que, ao perder tanto, eu estava saindo ganhando. Nesse sentido, a frase da revista volta à minha cabeça: nem todo mal faz mal. Nem todo bem parece ser bom por fora e nem parece ser bom a princípio. Muitas vezes, a gente só percebe os ganhos muito tempo depois.

A verdade é que cada atitude nossa tem consequências, e se envolver é, inegavelmente, uma atitude de altíssimo risco. É como a bolsa de valores (se bem que hoje em dia, fica até difícil usar esse referencial): você pode aplicar em ações mais seguras, porém com um rendimento mais modesto. Se você for mais arrojado, poderá investir sua grana em algo mais arriscado, mas que poderá render bem mais caso você tenha apostado correto. Cabe, a cada um de nós, definir qual o nosso perfil de investidor quando o assunto é relacionamentos, e assumir para si a inteira responsabilidade pela relação diretamente proporcional entre risco e recompensa. Acredito que as relações superficiais estão para as poupanças de renda fixa assim como os grandes romances estão para as ações da Vale: você pode evitar o prejuízo, mas também poderá acabar evitando maiores lucros.

Na tentativa de balancear o delicado equílíbrio entre meu lado racional e o emocional, continuo buscando por dados de realidade e também por sentimentos que combatam a sensação de que tudo foi em vão. Procuro substituir a mágoa por compreensão, a sede de vingança por amor-próprio. Tento incansavelmente enxergar um colorido entre as tantas tonalidades de cinza que existem entre o branco e o preto, e tirar de tudo algum tipo de aprendizado.

Pois se ao me perder tanto acabei por meu reconquistar, tudo valeu a pena. Aliás, como diz o poeta, tudo vale a pena, quando a alma não é pequena.
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PS1: O nome da minha amiga foi trocado para que eu não perca (e agora é sério) a sua amizade.

PS2: A título de curiosidade, acredito que os prejuízos sofridos pelo ‘lado de lá’ foram maiores que os meus, pelo menos em relação ao aspecto concreto da coisa. Admito: um lado bem mesquinho aqui dentro morre de dar risada do paradeiro das coisas que acabaram ficando comigo. Desde a lata do lixo até o armário do meu melhor amigo, passando pela minha coleção pessoal de DVD´s e chegando ao baú de doações da igreja, tenho certeza que a perda daquele um foi o ganho de muitos outros :)

8 comentários:

Flavia Melissa disse...

Ah, mas assim vc tá quaaaase fazendo aquilo que disse que ainda não conseguia: agradecer por tudo!

E com os leashes quem se deu mal fui eu... Não vem não.

Bjs, amo :)

Pati Peterson disse...

habibinha, é vero, cada um assume o risco das perdas e triunfos em todos os sentidos numa relação com o outro... e mesmo que a gente trace nosso 'perfil de investidor' desde o começo, ganhos aparentemente fáceis podem custar caro ao nosso coração, até nos investimentos 'seguros', tb sujeitos a fatores que não podemos prever, ou no mínimo, programar...

por essas e outras, eu asseguro que o melhor investimento do mundo é o que fazemos em nós mesmos... seja a curto, médio ou longo prazo,
isso sim é ganho certo!!!

debaixo do colchão ou num bauzinho de estimação, todo o crescimento e o bem que são conquistas nossas, viram moeda que nunca desvaloriza e que jamais pode ser confiscada...

bjos da habiba

julia p. disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Fernanda Rossinih disse...

"Brilho eterno de uma mente sem lembranças"...

Anônimo disse...

"Aprendi com a primavera a me deixar cortar. E a voltar sempre inteira."

Anônimo disse...

Pode-se dizer que valeu a pena e depois de um período tenebroso vieram os louros ... o seu olhar se abribu para o novo horizonte!

Amo habibinha!
Beijos
Marson

Anônimo disse...

penso que temos que nos perder de alguma maneira para nos encontrar...o que realmente são prejuizos??? um trocado (seja qual o valor)uma blusa não devolvida, saiu barato mediante a angustia da incerteza que eu vivia...ao fechar as portas...no escuro vc começa a ver novas possibilidades...digo que preciso sangrar td para depois curar a ferida...concordo com td...e alias aquele ladinho vingativo...estou melhor do que ele...hj tenho paz...
Bjs...querida amiga...

Fernanda S. disse...

Amiga!!!!
Demorei, mas vim aqui deixar meu recadinho!
Achei seu texto mto sincero... afinal, às vezes, por mais que queiramos ver o lado bom da coisa, é difícil! É difícil, pois somos humanas, de carne, osso e muito sentimento!
No entanto, é bom renascer das cinzas, sacudir a poeira e olhar pra frente! As "lombadas" aparecem para que possamos tropeçar, mas logo se recompor e ver que há uma estrada inteira a ser seguida!

Tenho certeza que você ganhou e mto: você mesma!

Beijocas cheias de saudade =)