Por Monja Coen Sensei
As verdades e as mentiras não disputam mais pelo mesmo espaço. Luz e sombra conversam tranquilamente no sofá.
Livres de validades, os prazos, as dívidas, as dúvidas, os contratos, os créditos, e as senhas saem batendo asas.
Um velho segredo é descoberto dentro da gaveta, outro mais novinho, sorri maroto no fevereiro da agenda.
Engraçado, mas o bibelô da estante que sempre foi verde agora parece azul.
Sem dramas, a metamorfose caminha pela casa implacável, irreversível, silenciosa.
Nenhum sonho fica escondido embaixo da cama.
Apenas lembranças exalam como perfumes que a gente sente de olhos fechados.
Desesperada, a caneta esferográfica insiste nas anotações, números de telefones, coisas que a gente não pode esquecer, coisas que a gente não pode esquecer, coisas que a gente não pode esquecer, coisas que a gente não pode esquecer.
Mas o importante já foi guardado.
A morte de alguém que amamos é uma enxurrada, um desabamento dentro de nós , sem sobreviventes.
Meu amigo Fred levou consigo a alma da casa e de cada objeto.
Levou a paisagem da janela, nossos finais de semana, levou uma batida do meu coração.
Levou as caipirinhas, os sorvetes e uma linha da minha mão que era só dele.
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