O que dizem seus olhos por detrás
da fotografia? Procuro, atenta, nos sinais de sua fisionomia, algo que me
ajudasse a prever nosso futuro. Mas observo, ali em seus olhos escuros, o ar profundo de quem nada sabia, um olhar tranquilo que nada revelava. Haveria algum indício
de nossa jornada? Ou algum prenúncio da nossa separação? Pois vi suas pupilas
dilatarem, e os cantos de seus lábios se retesarem, segundos antes da sua
confissão. De lá pra cá, quase nada mudou, e o seu retrato continua igual. A
minha vida seguiu o curso normal de quem carrega o peso da história que
restou: poemas lascivos com temas recorrentes, rimas estranhas e versos
reticentes, palavras espalhadas em todos os cantos da casa - na contracapa do
meu livro favorito, na palma da minha mão esquerda, na última página da agenda,
num guardanapo molhado de bar, no encarte do CD que me lembra você, ou na
mensagem de texto que não cheguei a enviar. Se os olhos são a janela da alma, quanto
tempo ate a minha secar? Os seus, na foto, jamais irão mudar, e o nosso passado
eu jamais vou reverter. O que me sobra, então, para fazer? Fumar cigarros,
beber e escrever, textos lindos que você nunca irá ler. E se acaso ler, que
diferença faz? O transtorno do tempo é jamais voltar atrás! E as histórias que
não chegamos a viver ficam ali, contidas neste hiato: nós moramos,
felizes para sempre, aqui, dentro do meu porta-retrato.
Nenhum comentário:
Postar um comentário