segunda-feira, julho 28, 2008

Solteiros paulistanos

É duro ser uma mulher solteira na 5ª maior cidade do mundo. São Paulo tem 19 milhões de habitantes, e é a maior cidade japonesa fora do Japão, a maior cidade espanhola fora da Espanha, e a terceira maior cidade alemã fora da Alemanha.

Morar em São Paulo significa viver num caldeirão de cultura em plena fervura. Aqui, não existe fogo baixo: encontra-se o que quiser, na hora que quiser, da maneira que quiser. O mais engraçado é que, com tantas opções, as mulheres acabam sempre disputando o mesmo espaço. Assim, enfurnam-se sempre dentro dos mesmos bares lotados, em busca de uma bebida e de um papo. E após a noitada, invariavelmente, concluem que sair à noite em São Paulo já não traz nenhuma novidade, pois todos os homens são i-guai-zi-nhos.









Sair à noite em São Paulo já não traz novidades: todos os
homens parecem iguais.


Entretanto, a cidade oferece tantos tipos diferentes de pretendentes que, em menos de um ano, minha amiga Christie* experimentou de tudo: médico psiquiatra, professor de kitesurf, policial civil, jogador de futebol americano, estudante de Direito, produtor musical, ator e até mesmo um peão boiadeiro. Resultado: zero relacionamentos.

O paradoxo do igual-mas-diferente dá no que pensar: afinal, talvez esta seja uma das maiores dificuldades de ser solteira(o) na cidade: muita oferta, muita procura, muitas diferenças a serem colocadas na balança. Aqui, se encontra desde hippies charmosos até executivos fetichistas. Há de tudo, o que significa também que é possível ter tudo. O lema da vez: possua tudo, antes que fique sem nada! (Se você pode ter tudo, por que escolher uma coisa só? E se existem tantas opções, tantos estilos, tantas diferenças, por que esta sensação de que tudo é sempre igual?)










O sexo está nas entrelinhas de todas as nossas relações.




Os primeiros encontros costumam seguir um padrão: geralmente um jantar, ou um cinema, às vezes um cinema seguido de jantar. Se você já está calejada, talvez acabará na cama; se ainda estiver resistindo às exigências da metrópole, ou então farta do sexo sem compromisso, enrolará durante mais alguns encontros, na tentativa de que deste mato saia ao menos uma mísera lebre. Entretanto, uma coisa é certa: fatalmente, o dating tentará algo. O sexo está nas entrelinhas de todas as relações, incluindo aí as amizades entre homens e mulheres - se somos amigos, por que não fazemos sexo? A verdade é que o sexo em São Paulo é quase tão comum quanto os engarrafamentos.


Minha amiga Elisa* mudou-se para São Paulo há quase 2 anos e ainda se espanta (e sofre) com a banalidade das relações paulistanas. Ela não está muito acostumada ao fato de que dormir com alguém não significa, necessariamente, que ele a apresentará para a família ou que cuidará dela quando ela estiver gripada. Na verdade, ninguém disse à ela que, ao transar com alguém por aqui, é mais provável que este alguém suma do que a relação se estenda. Diz ela que lá, em sua cidade, fazer sexo é 50% do caminho rumo a um relacionamento de verdade, estável e monogâmico. E a diversidade de parceiros e a frequência com que uma mulher faz sexo é motivo para que toda a cidade comente sua moralidade, o que é, em parte, um grande fator para que as mulheres sejam mais recatadas (gostos diferentes e manias bizarras, logicamente, não são bem-vistos).

São Paulo oferece anonimato, mas cobra alto por isso - aqui, você é apenas mais uma entre os quase 20 milhões de cabeças-ocas. Então, ok, você apronta o que quiser, escolhe tantos quanto quiser, trepa com cada um deles em dias diferentes da semana... mas, em quase 90% dos casos, vai continuar se sentindo sozinha porque esqueceu do fato de que você poderia ser apenas a quinta-feira daquele homem fantástico.

Na maioria das vezes, continuamos nos sentindo sozinhas.



O curioso dos romances paulistanos é que, de maneira geral, eles estão baseados na qualidade do sexo. Foi-se o tempo em que o que contava era a personalidade, os princípios, o caráter de uma pessoa. Hoje em dia, um sexo fantástico pode ser motivo de prender duas pessoas que, na maior parte do tempo, não se suportam.

Aliás, um sexo incrível engana muita gente – mania que temos de nos encantar por corpos, e não por mentes, e acabar nos apaixonando por quem apenas te come muito bem, obrigada (o que me remete àquela frase: amamos mais o sentimento de amar do que o ser amado). Trocando em miúdos: a gente gosta do cara porque ele transa bem, ou a gente gosta de ver que o cara fica maluco com a gente? No fundo no fundo, vamos lá... isso não é puro narcisismo?

Independente de sermos homens ou mulheres, se estivermos sempre procurando novas formas de “masturbação egóica”, talvez esteja aí a origem da mais frequente reclamação feminina: elas se sentem substituíveis. Se falta algo na morena que faça um homem se sentir o Sr. Super-Sexy, a loira trata de compensar, e nem ao menos a dor de cabeça de ter que se explicar existe mais para o cara – nesta cidade, alguém desaparece sem deixar a menor pista, e um cara pode sumir tão facilmente quanto o salário do bolso do trabalhador.

Seria das mulheres a culpa por isso? Algo em nosso comportamento mostra aos homens algum risco em continuar agindo como agem? A bem da verdade... por que é que eles deixariam de agir assim? Que vantagem levariam eles? Afinal de contas... não fomos nós, mulheres feministas que queimam sutiãs em praça pública, clamando por igualdade entre os sexos, que fizemos de nós artigos de fácil acesso, rápido descarte, zero problemas na devolução?




Não seria a culpa das mulheres
que, feministas, insistem na
igualdade entre os sexos?




Numa sociedade em que o que impera é o princípio do prazer e a satisfação imediata, como alcançar a difícil integração sexo + amor? Se o sexo é uma razão válida tanto para manter quanto para terminar uma relação, e se o amor sempre traz consigo questões cuja resolução às vezes requer tempo e paciência, quem ainda está disposto a pagar para ver? Ainda vale a pena tanto esforço? Faça você as contas: de todos com quem já saiu, quantos deram realmente certo? 10%? 5%? A questão é estatística: de 10 homens com quem já saí, 12 não deram em absolutamente nada.

Enquanto essas perguntas ficam no ar, alguns punhados de pessoas já fartas dessa babaquice ficam achando que o problema é com elas - elas são gordas demais, interessantes de menos, pobres demais, ou qualquer-coisa-demais-ou-de-menos para serem amadas. E outros punhados já estão convictos de que o amor acabou, e limitam-se a prospectar novas presas sexuais, novos jantares-seguidos-de-cinema, novas desculpas para não se relacionar, novas noites solitárias. O velho medo de amar.

A verdade é que, assim como tudo na nossa sociedade moderna, a maioria dos romances nesta cidade são efêmeros. Podem durar menos de duas horas, dependendo de quão bom foi o beijo durante o filme. Podem durar minutos, num engarrafamento na Juscelino, ou na saída de uma lanchonete da cidade. Pois em São Paulo, um simples sorriso é capaz de colorir um dia cinzento, um abraço gostoso já deixa os cabelos em pé. Afinal, temos medo que seja o último – o último sorriso, o último abraço, o último sinal fechado.

O medo da solidão, a carência e o desejo de ter alguém parece estar infiltrado nos nossos corações e em nossas mentes como um câncer: dói, dá trabalho e por vezes destrói o que possuímos de mais importante – os sentimentos, a pureza, a autenticidade.

É tanta coisa no menu que eu já nem sei o que comer" - já dizia o velho Raul...

Solteiros em São Paulo: somos produtos de uma sociedade ansiógena, exigente e narcisista. Ávidos por romance, fartos de decepções, cheios de traumas, cansados desse troca-troca.


Quanto a mim, ando oscilando – me pego cantando desde canções românticas até mesmo as do velho Raul: “é tanta coisa no menu que eu não sei o que comer...”

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* Os nomes verdadeiros foram trocados para preservar a identidade destas lindas solteironas.

4 comentários:

Anônimo disse...

Será que existe luz no fim do tunel

Priscila Rocha disse...

ORIMUGANG!
kKKKKkkKK!

BJOK!

Flavia Melissa disse...

Sis...

Claro que existe luz no fim deste túnel.
Caia fora de Sampa.

É mais fácil vc se mudar do que Sampa mudar, o gigante não muda, o gigante impera. E quando dorme, ronca alto.

Claro, existem exceções: os carinhas que também estão ao oitavo degrau da escada. São dez no total e, obviamente, vai ter muito mais gente distribuída pelos degraus debaixo do que do oitavo prá cima. Em Sampa, então, é quase mais fácil topar com um gnu do que com alguém tão ou mais legal que você.

É a vida...
Ainda bem que a gente ainda pode aprender!

Amo ;)

(não comento sempre. mas leio!)

Ricardo Pereira disse...

Nana my dear, sempre instigante, estes diagnósticos seus da vida são perfeitos, mas duas coisas que eu pensei depois de ler:

o amor não é a resposta, nao fazemos a menor idéia do que se trata, inventamos ele como inventamos deus e nos punimos por não sermos abençoados

segundo, mesmo o sexo fantástico é sexo por sexo é sexo por fazer é sexo só sexo é sexo por prazer, imprescinde de amor para ser e quando tem amor envolvido é sexo novamente, não há como fugir, nem há porque fugir, você pega sempre no pé das mulheres, como se elas fossem culpadas como se houvessem culpados

a culpa virou uma desculpa

na maioria das vezes, são só idéias que me vem