quarta-feira, abril 28, 2010

Parece, mas não é




Sensibilidade às vezes é intolerância.

Convicção, arrogância.

Impulsividades se disfarçam de coragem, confiança pode bem ser prepotência.

Determinação pode ser teimosia. Perseverança, negação da realidade.

O que era crença se revelou necessidade. O otimismo, ilusão.


Sobem-se os véus do desencanto, primo antigo da paixão.


A história de amor era apenas dejá vu.

terça-feira, abril 27, 2010

"Não fica assim, moça"

Foi o que me disse o segurança, ao me ver saindo em prantos da farmácia com minhas novas bolinhas de dormir.

“A gente se doa tanto que o coração fica assim apertado. Tem que esperar menos do outro, mas o ser humano é assim mesmo.”

Que sábias as palavras e que delicadeza dentro de um terno preto, como tantos que vemos por aí.

Agradeci sua preocupação, valorizei de verdade, mas para mim foi só uma maneira bonita de dizer as minhas mesmas palavras: eu dei meu sangue, entreguei meu corpo, e sugaram minha alma, só me deixando a carcaça...

sábado, abril 24, 2010

lacuna

Foi como um soco na cara. Aqueles rostos todos conhecidos, me sorrindo amarelo, como se dissessem “foi bom enquanto durou”. Uma multidão de gente estranha, com quem jamais me identifiquei, como que me consolando através do olhar. A porrada na cara de ser bem tratada pelos seus familiares, carregados de condescendência, carregados de empatia – a empatia que você não teve. Ali, no universo que uma vez foi apenas meu, também deixei que você adentrasse, sem no entanto receber o espaço mínimo necessário para fazer parte do seu dia-a-dia. O tapa no rosto é perceber que doei tudo aquilo que eu tinha, todos os meus espaços, todos os meus universos, sem ter deixado sequer uma lacuna no seu cotidiano, nem uma brecha que você procure preencher com falsos pensamentos de conformismo, nem uma fenda que te mostre hoje a falta que minha ausência te traz. Nada. Percebo hoje que sua vida tão plena, seus amigos sorridentes, sua família unida e feliz, todo seu universo uniformemente preenchido me reflete o rombo que no meu ficou quando te arranquei a duras penas do meu cotidiano. Esse rombo, sei que me pertence – mas a ausência da adrenalina na qual você é viciado, a falta do frisson inicial que qualquer relacionamento sofre com o passar do tempo, a maneira como você se entedia tão logo a novidade te deixe, é isso que hoje me traz a certeza de que foi melhor assim: sua vida pode ser completa demais para poder me acolher, mas ao mesmo tempo, eu sempre fui grande demais pra caber dentro de você.

sexta-feira, abril 23, 2010

pelo que esperar



Tempo, que passe.

quarta-feira, abril 21, 2010

Inércia

Queria acordar e ver que tudo isso é um sonho, um sonho bizarro e mal-vindo. Mas o tempo congela quando não se tem o que esperar, e se torna preferível passá-lo dormindo. Tudo se torna pálido e lento, e é preciso procurar muito a fundo por um motivo verdadeiro de empenho. Procuro me desapegar do resultado e atentar ao processo, mas é duro quando este é um contínuo elaborar de perdas. De se lamber feridas.

Racionalizar, procurar alívio. Esta é a rotina. Buscar conforto na falsa idéia de que se tentou de tudo. O mundo inteiro parece uma festa para a qual eu não fui convidada, e fica cada vez mais incoerente que coisas tão complexas possam ter se defeito de maneira tão assombrosamente simples. Rápido, mas não indolor. Como um esparadrapo retirado de uma pele em carne-viva, sem preparo algum.

As saudades, estas já haviam. Mas a perda se torna estranhamente concreta quando tudo o que se ouve é o barulho ensurdecedor do silêncio – nada restou. Fluindo na densa maré da inércia, procuro aceitar o tempo pacientemente enquanto ele escoa dolorosamente por entre meus dedos. Os ponteiros dos relógios são apenas hastes finas, que observo correrem sem fim. Subitamente descubro, é isso: o tempo é o bem mas precioso que um ser humano poderia perder.

terça-feira, abril 20, 2010

Lugar errado



Um viajante vinha andando pela rua quando avistou, na esquina próxima, um homem a procurar algo no chão, embaixo de um poste de luz. Aproximou-se do homem o viajante, e perguntou-lhe o que fazia. “Procuro por minhas chaves, que perdi”. O viajante imediatamente se prontificou a ajudá-lo. Procuraram por muitas horas a chave perdida, debaixo da luz do poste, sem sucesso. Horas mais tarde, já cansados, pararam para descansar. O viajante então perguntou ao homem: “Parece não estar aqui. Você não tem idéia de onde poderia ter perdido sua chave?” , ao que o homem disse “Sim, eu perdi na rua de trás!”. O viajante, confuso, indagou: “Mas, oras, então por que a procura aqui?”. Ao que o homem respondeu: “Aqui tem luz.”

sexta-feira, abril 16, 2010

procuro

Meu coração quase parou quando vi, reluzente, aquela moto preta parada próximo à minha garagem. Nestes dois segundos que levei para compreender que não era você, nova angústia aportou no meu peito e a vontade de gritar foi quase incontrolável. Não, não era sentimento novo. Apenas mais uma dose. Apenas mais um momento em que busco te encontrar onde quer que seja. Procuro por você em meio ao caótico trânsito de São Paulo, mesmo sabendo que jamais te acharia. Te procuro no portão do meu prédio com falsa e cruel esperança. Te procuro na minha caixa de entrada, nas letras não escritas daquele email em branco. Te procuro dentro de mim e o que encontro são fragmentos de um sonho distante, de data antiga, meses e meses atrás. Te procuro nas histórias que sobrou para eu contar. Procuro por nós dois dentro de cada casal que vejo na rua, dentro de cada par de mãos dadas com afeto, dentro das músicas que costumávamos ouvir, da canção que você prometeu tocar. Não nos encontro mais. A vontade de chorar se torna enlouquecedora quando penso que a falta que sinto já não é nova aqui dentro, a saudade só se tornou oficialmente constante. Falta – uma palavra pequena pra descrever quando um pedaço de nós já morreu.

quinta-feira, abril 15, 2010

Aceitação & Entendimento




Uma paciente me perguntou hoje: “como posso aceitar isso se não consigo entender por que isso está acontecendo?” A pergunta me fez pensar... Será que é possível aceitar algo que não conseguimos compreender? Ou será que são tarefas diferentes, independentes uma da outra? Diante de algo conflitante, seja uma perda repentina, um sentimento que acaba, uma decisão inesperada, temos sempre a tendência de procurar por um sentido, uma explicação para tudo aquilo. Como tudo pôde ter mudado tão rapidamente? Como em questão de segundos, minutos, dias, algo que parecia tão estável de repente se fez diferente? Como posso me antecipar a este tipo de surpresa, acontecimento, fatalidade?

Talvez o primeiro passo seja mesmo tentar entender, afinal a sabedoria requer conhecimento. Mas diante do fracasso de uma tentativa, se torna fundamental aceitar o não-entendimento. Afinal, o mundo é tão complexo, tão cheio de variáveis interdependentes, de ações e reações e mais reações, que fica difícil delimitar uma linearidade causal – o bom e velho fio da meada. Onde foi que tudo isso começou? Que decisões eu tomei ao longo da vida para chegar até aqui? Bom, em última análise tudo isto está acontecendo porque, em primeiro lugar, eu nasci, lá, 27 anos atrás. Então tudo isso deve estar acontecendo porque... a vida é assim? Uma confusão caótica de idas e vindas, decisões e escolhas e renúncias e caminhos intrincados e gente que aparece e escolhe, e renuncia, e trilhamos milhares de caminhos dentro de um só...?

Compreendemos tão pouco! Somos tão ignorantes no que se trata da compreensão da vida humana e da nossa existência! Talvez este seja o entendimento que devemos procurar, ao invés de nos fatigar em desvendar essa complexa teia que nos emaranha todos os dias. Aceitar o não-entendimento retira um peso enorme dos ombros, exercita a humildade e elimina a arrogância, além de aliviar o nosso fardo de ter que decidir corretamente, ter que agir corretamente, ter que fazer tudo corretamente. Errar é permitido, a perfeição não é mais esperada – como humanos bobinhos que somos, dentro do nosso desentendimento, talvez o que de mais correto possamos fazer é seguir o fluxo das coisas sem tanta auto-exigência, tendo a humildade e sabedoria de correr atrás do prejuízo quando percebemos nosso erro. Se vai dar pra consertar, são outros 500, mas a humildade, por si só, já é o bastante para entendermos o quanto, a bem da verdade, não entendemos praticamente coisa alguma...

terça-feira, abril 13, 2010

por linhas tortas

Tento com todas as minhas forças ter firmeza o bastante para continuar, para que eu fraqueje cada vez menos e que a culpa não venha me assolar. Preciso me convencer de que o universo conspirará sempre a favor, mesmo que das maneiras mais tristes. Me concentro na idéia de que os sofrimentos simplesmente fazem parte desta vida, de que se originam especialmente no apego e desejo excessivo. Tento me perdoar pela forma tosca com que procurei afastar-me das origens do meu sofrimento, mas procuro me ater ao fato de que não importa de que forma consegui sair deste limbo, o que importa é que saí. Nem sempre fazemos algo da maneira mais adequada, e devemos colher as conseqüências das nossas atitudes, mesmo as que foram motivadas pela tristeza ou pelo desespero. Nesse momento, busco meu perdão, mesmo que aquele a quem feri não consiga me perdoar. Fiz o que consegui fazer – se até Deus escreve certo por tortas linhas, por que eu não haveria de falhar?

domingo, abril 11, 2010

Estiagem



As palavras me faltam à mente quando tento expressar o que sinto de qualquer maneira mais objetiva. É um amontoado de sensações tão intensas, tão estranhas, que fico simplesmente olhando para o papel esperando que algo aconteça. De certa forma, não deixa de ser o que fazia também com minha vida: a observava passar, na esperança de que um sinal me fosse dado, me forçando a agir. Como posso então me ressentir da vida, que me trouxe todas as respostas?

Não reconhecia ao certo o que estava meu lado. Era de fato algo por que me encantei. Algo que me fazia sentir-me verdadeiramente especial. Fazia-me sentir escolhida, enquanto que hoje me parece que eu apenas escolhi, entre tantos sorrisos, aquele que mais me envaidecia. Talvez o que mais me doa hoje é ter de reconhecer que não fui feliz como achei que seria quando fizesse este tipo de escolha. Talvez porque a escolha tenha sido precipitada, e me resta simplesmente admitir que a intenção fracassou.

Após tanto tempo montando meu jardim, cobrindo-o de ricas sementes e flores de cores alegres e cheias de vida, é dolorida a sensação de fechar novamente as suas portas, simplesmente por não sentir mais orgulho dele. Talvez com o outono tenha chegado novamente a hora de um novo balanço, hora de nova semeadura em meio à estiagem, plantar novas flores e então torcer – torcer para que o sol esquente o tanto quanto for necessário para que estas novas sementes possam se aquecer, gerando farta e tão esperada colheita.

Caos calmo


A calma só habita os corações convictos.

terça-feira, abril 06, 2010

Sofrimento - de Chico ao Budismo



No fim de semana passado, fui assistir ao filme do Chico Xavier. Como já disse aqui algumas vezes, não sou religiosa, tampouco espírita. Gosto de beber de várias fontes, e tendo sempre achado o Chico um baita de um Buda, não havia razão para não ir assistir ao filme.

Críticas à parte, posso dizer que gostei de 80% do filme, mas uma parte dele, em especial, me chamou a atenção. Parece que o Chico estava num avião, voando sabe-se lá para onde, quando uma forte turbulência o deixou em pânico e ele começou a gritar “Meu Deus, me ajude, socorro!”. A cena toda é muito engraçada, Chico desesperado devia ser uma cena rara. Bom, neste ínterim, lhe aparece seu guia espiritual Emmanuel, que lhe censura pela gritaria. De nada adianta Chico justificar seu desespero na situação de vida ou morte – “Tanta gente corre risco de vida! Neste exato instante! Você acha que é privilegiado? Se corre risco de vida, então pare de gritar e morra com educação”, disse um Emmanuel severo e muito, muito sério.

Hoje, assistindo à palestra semanal da Monja Coen Sensei, do ZenDo Brasil, o tema me voltou à cabeça. A primeira das 4 Nobres Verdades budistas diz exatamente a mesma coisa, em diferentes palavras: na vida, a dor e o sofrimento estão sempre presentes. É como uma característica essencial da existência humana - quem está vivo sofre, em um momento ou em outro. Sofre por diversas causas, separações, perdas, doença ou morte, ruína ou excessos, mas invariavelmente sofre. E isso não é um conceito teórico, uma idéia, uma analogia. Esta é a nossa realidade, nosso cotidiano, nossa experiência desde a infância. Nós sofremos. Ponto.

E se nós sofremos e choramos e temos más experiências desde a infância, se a tristeza de quando em quando simplesmente nos ocorre, por que é que nos apegamos tanto ao sofrer? Por que é que cada vez que nos sentimos triste, sofremos como se estivéssemos muito surpresos por não estarmos de todo contentes?

A gente tende a alimentar o sofrimento, carregá-lo de justificativas, inconformismos, indignações. Ouvimos desde cedo que temos que ser felizes, felizes, felizes, quando sofremos algo vai muito mal, temos que fugir da dor como diabo foge da cruz. Vemos o sofrimento como uma pegadinha que nos espera atrás da porta, quando deveríamos ver a dor como simplesmente uma parte da vida que, como todas as outras, vem e vai. A tristeza também passa, se a gente não se apegar.

Mas não! Não, a gente se apega ao sofrimento numa completa não-aceitação, como se devêssemos ser imunes à tristeza e o sofrimento nos fosse muito estranho. A gente leva para o lado pessoal e se acha super coitadinho, não acreditamos que aquilo está acontecendo. Somos os únicos em sofrimento naquele momento, somos especiais. É quase como se pulássemos de um abismo e ficássemos magoados com a Lei da Gravidade, que nos fez cair. Sacanagem, essa Lei que nos persegue.

Está mais do que na hora de aceitarmos que o sofrimento é uma condição intrínseca à existência humana, e pararmos de nos surpreender com as dificuldades da vida. Não é a gente que é coitadinho, não é a nossa vida que é muito dura. Vidas são duras. Viver é difícil. Mas se torna muito mais difícil se a gente olha apenas pro nosso próprio umbigo e fica sentindo pena de si mesmo.

Da próxima vez que eu me sentir triste, com raiva ou coitadinha, culpando o trânsito, a economia ou o namorado, tentarei me lembrar que outros tantos seres humanos estão em dificuldade iguais ou até maiores. Na palavras da Monja Coen Sensei: se olharmos para cima, sempre veremos coisas mais elevadas e melhores do que nós. Mas se olharmos para baixo, sempre haverá situações mais difíceis.

O negócio é deixar passar. Ver a dor como algo natural e deixá-la acontecer, sem se apegar e se identificar com ela. Devemos é exaltar as alegrias, para permitir que a dor ceda espaço ao contentamento.

No fim das contas, questão de perspectiva. Parafraseando o poeta, a dor é inevitável, mas a proporção do sofrimento é opcional.

sábado, abril 03, 2010

Partida


Lidar com a saudade não é fácil. Agüentar a perda, seja ela concreta ou abstrata, é sempre doloroso, e para mim se torna especialmente difícil tolerar a falta e a passagem do tempo.

De nada adianta ter a consciência de que existe em mim um problema antigo relativo às separações. Perdas, abandonos, ausências – tudo fica sendo uma coisa só na qual se materializa o sentimento irracional, mas absolutamente concreto, da rejeição.

E enquanto me sinto só, olhando com olhos vazios para o quarto de dormir de minha irmã ausente, me pego constantemente sentindo um vazio que, desconfio, sempre esteve aqui. Seria a separação a única responsável por este sentimento eclodir? Ou estou ignorando outras tantas variáveis?

A sensação é de desamparo, apesar da tamanha esperança sobre o dia em que tornarei a encontrá-la. O destino é o oriente, na melhor das hipóteses, vencendo a ganância das posses e utilizando os bens materiais para matar a saudade. Os planos anteriores haverão de ser recapitulados. Notas de real vencendo obstáculos e superando distâncias, me aproximando de quem verdadeiramente me oferece companhia. Hoje, apenas isso faz sentido pra mim.

E enquanto isso não acontece, enquanto me vejo sozinha em meio às dores violentas da separação, tento encontrar as forças estruturais que haverão de me fazer emergir deste grande canyon, deste denso buraco negro nas qual todas as questões são engolidas, todos os afetos se dissolvem, onde tudo ecoa pela enorme dimensão do vazio.

O tempo se arrasta.

Neste momento, apenas o silêncio me consola.