segunda-feira, março 16, 2009

De bode!



Eu ando tão de bode do ser humano que tenho pensado em concordar com o que diz Schopenhauer: feliz é o homem que consegue evitar a maioria de seus semelhantes.

Mas como eu, que sempre me considerei uma apaixonada pelo ser humano, poderia concordar com uma afirmação dessas? Teria eu perdido o gosto pela convivência humana básica? Estaria eu viciada na minha própria solidão? Ou será que perdi a fé na humanidade?

Eu ando tão, mas tão bodiada das pessoas em geral, que tenho passado grande parte do meu tempo sozinha – o que posso afirmar que tem sido mil vezes mais gratificante do que conviver com a maioria das pessoas. E quando eu paro para analisar quantas das pessoas que me circundam me oferecem o mínimo que espero, dá vontade de chorar.

Todas as pessoas se dizem honestas, virtuososas e de bom coração. Quase todas elas se dizem generosas e espiritualizadas. Muitas se orgulham de como são com amigos e família. Mas pare por um momento para observar uma conversa trivial e você verá que, na verdade, quem escuta está louco para que o outro pare logo de falar, para que ele possa finalmente dar vazão à sua própria diarréia verbal: quanto está ganhando, onde passou as últimas férias de verão, com quem foi a última trepada, qual o carrão que está comprando, qual o restaurante fa-bu-lo-so que foi semana passada, que livro super cult está lendo.

Praticamente ninguém escuta de verdade. Praticamente ninguém sente verdadeira empatia pelo que o outro sofre. Todos estão, a bem da verdade, rezando para que você melhore logo e possa voltar a ser a pessoa bonachona e risonha de sempre – foda-se a que custo. Por trás de todo sorriso fofinho, parece ter segundas e terceiras intenções.

Ao longo da minha vida, segurei inúmeras barras de incontáveis pessoas. Não é por acaso que virei psicóloga – acho que eu sempre tive mais facilidade para falar coisas que realmente façam algum sentido para quem está em sofrimento, ou pelo menos mais sentido do que “Foda, vai passar”. Claro que é foda, claro que vai passar. Mas seria ótimo escutar alguma coisa mais consistente, só para variar um pouco.

E depois de segurar a bronca de tanta gente, e aí sim é ironia, eu paro pra pensar e me pego me perguntando: quem segura a minha? Quem aguenta a minha barra? Quem consegue dar conta de me escutar sem dizer “puxa, sabe que eu também, uma vez...”. Foda-se sua vez, esta é a minha. Alguém consegue escutar?

Com o tempo, percebo que deixei de verdadeiramente me abrir. Quase sempre prevejo que não vou ser realmente escutada e fico, quando não totalmente quieta, apenas no superficial – me broxa. Salvo raríssimas exceções, minhas relações cotidianas se transformaram em verdadeiros palcos de circo onde eu, com um reluzente nariz de palhaço, acoplo um megafone ao meu ouvido e pronto: virei o ouvido do mundo. Senhoras e senhores, abram alas para suas logorréias, tem para todos!

Quem faz rir o palhaço? Quem escuta o analista além de, óbviamente, seu próprio terapeuta? Quem guardará os guardiões?

Não, a humanidade não está pronta para verdadeiramente empatizar com seus semelhantes. O ser humano não consegue enxergar no outro o espelho de si mesmo e abrir mão de um pouco de sua arrogância para estender a mão ao seu vizinho. A honestidade e a sinceridade das relações foram massacradas ao longo dos séculos pelo egoísmo e pela prepotência.

Tudo isso chega a ser um tanto patético. A verdade é que, como diz amigo meu, estamos cercados de comédia, o que me lembra mais uma vez Schopenhauer:

“Se olharmos a vida em seus pequenos detalhes, tudo parece bem ridículo. É como uma gota d’água vista num microscópio, uma só gota cheia de protozoários. Achamos muita graça em como eles se agitam e lutam entre si. Aqui, no curto período da vida humana, essa atividade febril produz um efeito cômico.”

O ser humano, de engraçado, ficou frustrante. Tão frustrante que parei de pensar que o problema está somente nas minhas expectativas: o mundo é muito egoísta e eu já estou farta de tentar ver em cor-de rosa algo que, em sua grande maioria, tá cheio de pontos pretos.

Talvez seja apenas o meu aniversário, ou talvez seja um restinho de inferno astral. Admito que isso me deixa chata pra caralho – mesmo tendo tido uma festinha fantástica (que figurará aqui cedo ou tarde). Mas o que quer que seja, a situação não muda: minhas orelhas estão doendo de tanto escutar, e minha garganta raspa e aperta com tanta coisa que eu ainda tenho a dizer.

É foda, foda pra caralho. Parem o mundo, pelamordedeus – eu quero mesmo descer.

6 comentários:

Marcello Fiore disse...

Com excesso de realidade?

Conforme-se, apesar da vontade ser grande, não dá para saltar desse mundo...

Luis Grottera disse...

Existem outros momentos, gata, que dá vontade de ficar aqui. Sabe, eu não me identifico NADA com o que tem aqui, a não ser com os cães, aí, os cães, me inspiram a ficar. Qual é SEU cão?

Priscila Rocha disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Priscila Rocha disse...

Se eu estiver cochilando me acorda que eu vou descer com você!
Não sei se você percebeu no pouco tempo de prosa que eu também tobemquerendoquetudoseexplodaporaqui!

Queria conseguir conversar mais BUT...
AMO assim mesmo!

Vou mandar as fotinhos!

Anônimo disse...

As vezes, a melhor coisa é resolver com vc, na terapia, em conversa com aqueles amigos pontuais que vc sabe que pode evoluir e extrair coisas produtivas. Mas, no geral só vc poderá alinhar e transformar sua vida em algo bacana.

Ter expectavivas nos outros já foi mais que comprovado que não da certo.

Não pq o outro não gosta de vc, mas pq é aquilo que ele pode dar em determinado momento.

Só nós sabemos verdadeiramente o que se passa "aqui dentro", mesmo passando pra frente, nunca será e terá o verdadeiro valor.

Amo.

Fernanda S. disse...

"A honestidade e a sinceridade das relações foram massacradas ao longo dos séculos pelo egoísmo e pela prepotência."

Infelizmente, Nana, por mais que vc não queira "ouvir" isso... estou no mesmo pé que você!!! E que pé no saco! E que saco na lua!!!

O cansaço já é físico também. As pessoas me cansam e me chateiam o tempo todo. E como posso continuar sendo tão amorosa com aqueles que me passam pra trás? Por que a gente é assim?! E cade a sinceridade do mundo?! Foi engolida, será??

Não sei não... só sei que estou tentando interiorizar certas coisas e praticar mais o silêncio.. mas não pra ouvir os outros, mas sim, a mim mesma, já que as pessoas não parecem estar preparadas e/ou interessadas na minha realidade!!!!


Amo!!! E sinto falta de verdade!!!
Vc ainda me deve uma conversinha.... hhehehe